Resenha: Mulheres, mitos e deusas

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Escrito em 1966, em meio a uma poderosa onda feminista pela luta de mais direitos para mulheres, Mulheres, mitos e deusas é uma bela homenagem a alguns dos grandes nomes femininos que fizeram história, seja ela real ou mitológica, em forma de coletânea. Recentemente, o livro chegou em uma edição belíssima pelo selo Goya, da Aleph! Saiba mais sobre Mulheres, mitos e deusas!

Algumas mulheres conheceram o céu, outras o inferno; umas foram enaltecidas, santificadas, outras demonizadas; mas todas tocaram as profundezas do próprio ser, chegaram ao limite de sua condição e de seu tempo e se eternizaram na história.
Ao tomar contato com a história e os dilemas vividos por figuras como Afrodite, Cinderela, Simone de Beauvoir e Virginia Woolf, a autora nos guia em uma viagem de resgate da essência perdida ao ressignificar o papel feminino no mundo.
O livro revela uma análise inteligente dos arquétipos, dos mitos e das lendas construídos em torno da mulher, demonstrando como eles acabaram por reafirmar o machismo na cultura ocidental.



FICHA TÉCNICA
Título
: Mulheres, mitos e deusas
Autora: Martha Robles
Páginas: 448
Ano: 2019
Editora: Aleph
Nota: 3,5
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LIVRO CEDIDO EM PARCERIA COM A EDITORA




Mulheres, mitos e deusas é um riquíssimo trabalho de organização de histórias e origens de figuras femininas. Escrito em 1966, em meio a uma poderosa onda feminista pela luta de mais direitos para mulheres, o livro é uma bela homenagem a alguns dos grandes nomes femininos que fizeram história, seja ela real ou mitológica, em forma de coletânea. Para quem gosta de mitologia, por exemplo, Mulheres, mitos e deusas é um prato cheio. Como escrito na nota à edição brasileira, a obra "escrita por uma mulher, sobre mulheres e sua subjacência na história; mas não se dirige somente a elas. Narra e discute a grande aventura humana sob a óptica particular do olhar feminino".

“Dentre centenas de versões infantis, multiplicadas em todas as línguas, ninguém poderia dizer qual é a variante mais fiel à versão inicial nem como essa delicada donzela pôde se elevar a tantos e tão contraditórios símbolos do feminino, relacionados com o trabalho esmerado e a ausência de recompensa. O certo é que. Em torno de um drama desenvolvido a partir da rivalidade entremeada pela inveja, descobrimos que, além de protagonizar uma intrincada trama de abnegação abjeta, típica da mulher degradada, sua infelicidade demonstra que, em um caso de tamanha perversidade como esse, somente a magia é capaz de modificar a condenação doméstica das mulheres.” Página 253


O livro é dividido em partes pensadas de acordo com alguns temas e momentos históricos. São elas: "As origens", que fala sobre algumas das mais antigas figuras mitológicas; "Da tragédia à história", que trata de mulheres com narrativas de superação que fizeram história dentro da mitologia grega e romana; "O amor", que reúne algumas mulheres cuja história está diretamente relacionado a narrativas amorosas e românticas; "As fadas", cujo próprio nome do capítulo já explica de quem vai se tratar; "Rainhas", uma das partes mais interessantes e que abordam figuras reais que venceram o tempo da vida; “Caminho de Deus”, parte dedicada às figuras femininas relacionadas a algumas religiões, com atenção especial às algumas figuras católicas e cristãs cuja expressividade se faz presente no México; e "Nosso tempo", parte que conhecemos algumas escritoras e ativistas contemporâneas.

O livro em si e as escolhas feitas pela autora possuem um caráter bem ocidental. Não existem referências a figuras femininas do oriente e acredito que isso deixe o livro um pouco superficial e, mesmo entendendo que seria impossível contemplar absolutamente todas as figuras femininas, o livro perde um pouco da riqueza cultural que poderia ter ao abordar outras figuras femininas orientais, como representações da cultura hindu, por exemplo, que trazem um leque gigantesco que poderia ter sido explorado. Entretanto, é interessante observar a presença de mulheres mexicanas, tendo em vista a nacionalidade da autora.


Eu particularmente não conhecia a maior parte dessas figuras, então o livro se tornou uma boa referência tanto para me apresentar a novas mulheres que deixaram sua marca na história, seja ela real ou mitológica, quanto para servir de base para futuras pesquisas e ensaios. Mulheres, mitos e deusas não serve tanto como material de análise e sim material de consulta sobre diversa figuras femininas através dos tempos.

As primeiras páginas cumprem esse papel de análise e trazem reflexões bem interessantes sobre o que alguns mitos e imagens de mulheres trazem para a representação do feminino e dos arquétipos das mulheres. Entretanto, por um bom tempo a autora se limita a apenas narrar a história das célebres figuras, mencionando vez ou outra a questão da mulher como forma de propor reflexões ou fazer pontuações, mas sem chamar a conversa e o diálogo a respeito dessas questões uma vez que ela logo passa para o próximo capítulo e a próxima mulher escolhida.

Ao contrário do que eu pensei e do espera-se pela sinopse, Mulheres, mitos e deusas não é um livro que estuda os arquétipos femininos contidos nas deusas e nos mitos femininos como faz Mulheres que Correm com os Lobos, por exemplo. Mulheres, mitos e deusas traz um catálogo de figuras femininas contidas em mitos, histórias bíblicas, lendas e no imaginário popular, apresentando sua história de forma resumida. Confesso que criei expectativas erradas, pensando que existiria uma parte maior de análise e menos de objetividade e apresentação de cada mulher. Entretanto, isso não tira o mérito do livro de ser uma excelente referência para quem quer conhecer mais sobre figuras femininas ao longo do tempo. Enquanto lia Mulheres que Correm com os Lobos, por exemplo, algumas figuras citadas em Mulheres, mitos e deusas aparecem e usei o livro como referência para essa leitura também. É o caso da história de Malinche, por exemplo.


A linguagem do livro é, por muitas vezes, bem acadêmica, levando em conta o fato de ter sido publicado pelo selo Goya, mesmo de História da Bruxaria. Para os leitores do gênero, é uma leitura bem fácil, mas para quem busca uma linguagem mais mastigada com informações mais sutis, pode ser uma leitura mais complexa e menos fluida. Além disso, por muitas vezes o livro adquire um caráter bem mais histórico e explicativo do que analítico.

Existem alguns detalhes que destoam na linguagem do livro, como, por exemplo, ao falar de Elizabeth I a autora de repente mudar a narração para a primeira pessoa. Acho que teria sido um recurso interessante se tivesse sido feito ao longo de todo o livro, de maneira padronizada. Entretanto, apenas com essa figura icônica em específico, ficou algo bem jogado e estranho, quase como um texto intruso no livro.

“Desejar tudo e desejar intensamente, com a plenitude que somente é inspirado pela rara combinação de poder e apetite pelo entendimento absoluto, não foi coisa muito frequente na história, especialmente em uma mulher.” Página 279


Mulheres, mitos e deusas também vem com uma edição bem caprichada, com capa dura, uma imagem que combina bastante tanto com o enfoque do livro, quanto no fato de chamar a atenção logo de cara ao já apresentar uma figura conhecida. Além disso, a diagramação do livro é bem elegante, com um espaçamento entre linhas bem agradável, com divisões de capítulos bem pensadas e uma estruturação inteligente.

“Trata-se dessas passagens que vão se rasgando sobre o papel como pequenos áulicos da memória, aprendizes do verbo, apenas eco da palavra fugidia e que acabam por calar a própria individualidade ou por desnudar a fibra imperceptível do espírito.” Página 388


Mulheres, mitos e deusas é um excelente livro para apresentar figuras femininas e suas histórias e conquistas. Não conhecia a maior parte dessas mulheres e isso é um ponto altíssimo. Com toda certeza é um livro para ser pensado como referência de estudo e coletânea de perfis de algumas das figuras ocidentais mais ilustres da história. É um livro que usarei para consultas futuras e é um belo acréscimo à minha coleção de livros escritos por mulheres e que falam sobre mulheres.

Gostou da resenha e quer conhecer outro livro do selo Goya? Então confira a reseha de História da Bruxaria!

“Delas a Virgem Maria herdou culturalmente a função única de intermediária entre os crentes e a bondade divina; porém, os demais atributos foram excluídos por uma civilização monoteísta que se atreveu a negar radicalmente a completude feminina, incluídas aí também suas veleidades. Daí a dupla importância, social e religiosa, desse arquétipo por excelência da vida terrenal incorruptas, cuja passagem na Terra, até o ponto em que sabemos pelo favor da fé, entregou-se à missão de consagrar a mais perfeita obra purificadora por uma humanidade castigada pelo pecado original desde a queda ancestral de Eva.” Página 298


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