Resenha: A Improbabilidade do Amor

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Falar sobre arte é falar sobre técnicas, estilos, composições, artistas e obras-primas. Mas falar sobre arte é também pensar na subjetividade, na emoção, na mensagem, no amor. No amor a alguém, a algum momento ou a alguma coisa. A Improbabilidade do Amor fala sobre pessoas, motivações, segredos, desejos, história. Arte. Amor.

Quer saber por que o livro de Hannah Rothschild é uma preciosidade literária? Então confira a resenha de A Improbabilidade do Amor!

"Quando Annie McDee encontra um quadro sujo em um obscuro brechó, ela não tinha ideia do que descobriu. Chef talentosa, mas falida, Annie cedeu ao impulso e gastou as últimas libras que tinha no bolso em um presente para um homem que mal conhecia.
Enquanto se debate com a solidão de um coração partido e a falta de perspectiva, ela está longe de imaginar as repercussões de sua pequena extravagância: singelamente pendurada em sua casa está agora uma obra-prima. De repente, Annie se vê sugada pelo tumultuado mundo das artes de Londres, povoado por socialites, oligarcas russos, leiloeiros desesperados e comerciantes sem escrúpulos, todos planejando colocar as mãos em sua grande descoberta.
Na tentativa de desvendar o passado da pintura, Annie descobrirá não apenas uma lista de antigos proprietários ilustres, mas alguns dos segredos mais sombrios da história europeia. E, quem sabe, se abrir novamente ao amor."


FICHA TÉCNICA
Título
: A Improbabilidade do Amor
Autora: Hannah Rothschild
Ano: 2018
Páginas: 544
Idioma: Português
Editora: Morro Branco
Nota: 4,5/5
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LIVRO CEDIDO EM PARCERIA COM A EDITORA



A Improbabilidade do Amor fala sobre a subjetividade de cada um por meio de uma obra de arte, uma pintura. É uma história sobre o amor, uma homenagem a uma forma de arte que sobrevive aos séculos e, a cada novo proprietário, se transforma sem mudar nada de sua pintura. Suas camadas se mantém praticamente as mesmas, a mesma pintura da época em que foi criada, mas sua história se molda e transforma com o tempo. Ela continua a mesma, mas ao mesmo tempo muda o tempo todo. É o que faz a arte universal e atemporal. O que faz de uma pintura uma obra-prima não é a forma como foi feita ou a perfeição dedicada a cada traço, mas sim o que ela faz as pessoas sentirem, que tipo de subjetividade ela desperta em cada um que a observa e a tem.

O livro de Hannah Rothschild conta a história de uma obra de arte considerada perdida há décadas: A Improbabilidade do Amor, do grande pintor e pioneiro do rococó Antoine Watteau. A pintura é a protagonista do livro que leva seu nome. Além de ser a narradora em diversos momentos, é o arco central que une todas as histórias dos personagens e representa alguma característica de cada um deles, seja o desejo por poder, fama, a busca por algum significado mundano ou até mesmo um sentimento mais profundo. Ela faz parte da história de cada um deles de alguma forma.

"Estou divagando. É um hábito odioso que veio com a idade e a solidão. Às vezes o bule da Bernoff me chamava de Pedro Pontífice. Eu ignorava a gozação. Então, gostaria de lhe pedir que não desista da leitura, agora virão alguns detalhes cruciais da trama. Talvez você até aprenda alguma coisa no processo." Página 111


Pela sinopse fica a impressão de que Annie é a protagonista do livro, mas sua participação vai se perdendo ao longo das páginas até que ela se torna uma coadjuvante e outros personagens ganham muito mais destaque e desenvolvimento. A própria narração acaba esquecendo Annie e focando nas reflexões propostas pelo livro e na narrativa geral.

A Improbabilidade do Amor se solidifica como uma história que tem como enredo as consequências da existência da pintura que dá nome ao livro. É como se a pintura entrasse na vida daquelas pessoas que sofrem por algum amor platônico, da mesma forma como seu pintor sofria. Por ter sido criada com base nesses sentimentos, é como se ela procurasse aqueles que a lembrassem de suas origens.

“Isso explica, um pouco, por que as pessoas querem ter grandes obras de arte. É um jeito de se conectar a um legado glorioso e magníficos soberanos.” Página 311


As reflexões feitas pela Improbabilidade do Amor são, definitivamente, um dos pontos mais destacáveis do livro. A forma como ela fala do amor, da vida, do comportamento humano e da passagem do tempo faz com que a história ganhe mais e mais camadas e se torne uma reflexão mais profunda e inusitada sobre a vida e suas formas de amor.

O livro abandona completamente o conceito de “é só uma pintura” ao mostrar as diversas camadas que um quadro guarda. Além disso ser apresentado por meio das escolhas de ambientação e motivações dos personagens, isso se mostra presente na escolha por colocar a pintura A Improbabilidade do Amor como uma narradora.

A própria pintura é uma narradora ousada, narrando apenas o suficiente para deixar o leitor instigado e curioso, escondendo fatos até a hora certa, revelando detalhes à medida que a narrativa se desenvolve, apresentando uma personalidade própria tão interessante quanto à sua própria história e seu passado.

 “Fui pintada para celebrar as cascatas revoltas do amour, a paixão ruidosa, agitada, avassaladora e transformadora que inevitavelmente dá lugar a uma infeliz, sufocante e opressora desilusão.” Página 310


Assim como um pintor trabalha as muitas camadas de sua pintura, A Improbabilidade do Amor traz diversos níveis de reflexão a respeito da arte. Um ponto muito recorrente ao longo de toda a narrativa, tanto por meio de diálogos dos personagens, quanto nas reflexões da própria Improbabilidade do Amor, é que a arte é subjetiva. Ela pode ser como é, com todas as suas cores, formas, contornos e história. Mas o que ela desperta em cada um é extremamente pessoal, individual e subjetivo.

A pintura é, também, uma das muitas formas de amor que existem. Além de tentar imortalizar momentos, ela também pode ser um presente passado de geração em geração e fazendo parte do acervo dos mais diversos amantes. A efemeridade do amor, principal ponto defendido pela própria pintura ao longo de toda a construção narrativa, também ganha destaque. O próprio fato de a obra ter tido tantos proprietários e passado por tantas mãos é uma forma de representar a efemeridade da vida já que, na história, essa pintura é a representação do amor em todas as suas nuances. Nas palavras de A Improbabilidade do Amor: “esta é a grande tragédia do amor - mesmo que você tenha a sorte de se deparar com ele, é sempre efêmero” (p. 311).

A Improbabilidade do Amor mostra como a arte também está muito ligada à história. Um mesmo quadro passou pelo correr dos ponteiros do relógio e viu os acontecimentos se desenrolando. Uma pintura com mais de 300 anos com certeza viu muita coisa e o livro também pega essa questão e trabalha por meio de uma das personagens.

“A arte faz os mortais se sentirem mais próximos do céu” Página 311


É preciso admitir que a narrativa demora para prender o leitor. As primeiras dezenas de páginas apresentam um universo extenso e detalhado que requer mais atenção do que o esperado. Como a estrutura narrativa e a linguagem se mantém inalteradas ao longo de todo o livro, é mais difícil para o leitor mergulhar de cabeça na história. Além disso, o desenvolvimento dos personagens é um pouco fraco. Como são muitos personagens que dividem o tempo de forma razoavelmente equilibrada, principalmente três deles, é difícil mergulhar no crescimento e nos dilemas pessoais de todos com certa intensidade. Então muitas vezes achei difícil me apegar a algum deles ou sentir empatia por seus dilemas como aconteceria se não houvesse essa escolha de narrativa. Por esse motivo, algumas escolhas dos personagens não faziam tanto sentido e pareciam não condizer com sua personalidade.

Entretanto, mais do que apresentar um desenvolvimento dos personagens, A Improbabilidade do Amor tem como objetivo fazer uma homenagem à arte como forma mais bela de expressão dos sentimentos humanos. Além disso, o que dá um toque a mais ao livro é a veracidade dos fatos. A escolha por um pintor expoente e a riqueza de descrição sobre sua obra e seu estilo artístico fazem com que A Improbabilidade do Amor seja um livro ainda mais precioso. Não é difícil acreditar em suas páginas.

No quesito livro físico, a edição da Morro Branco está linda. Com a folha de guarda repleta de bolinhas coloridas na mesma paleta de cores da capa, esse detalhe dá um toque a mais de delicadeza à narrativa. A diagramação também está linda, mas acredito que, pelo tamanho do livro, o formato poderia ter sido um pouco maior, de 14x21cm para 15,5x22,5cm para deixar a leitura menos blocada e mais fluida.


A Improbabilidade do Amor é um livro que se mostra para aqueles leitores dispostos a entender suas camadas e receber suas sutis reflexões. É um livro fácil de ler, mas que ao mesmo tempo não entrega nada de bandeja para o leitor. Cada um poderá tirar um pouco da narrativa. Assim como a própria arte, o livro A Improbabilidade do Amor oferece uma leitura subjetiva e pessoal que pode despertar os mais diversos sentimentos naqueles que abraçam esse enredo.

A história de Hannah Rothschild faz um lindo paralelo entre o que a arte deveria fazer que é despertar algo nas pessoas e o que hoje ela é: uma forma de ganhar dinheiro, lavar dinheiro, ostentação e riqueza. É uma história que ganha na delicadeza e nos faz relembrar como momentos, por mais efêmeros que sejam, podem mudar nossas vidas. Seja esse momento ao lado de uma pessoa ou apenas tendo contato com uma expressão artística. O amor se apresenta em várias formas: pessoas, momentos, lugares e, por que não, pinturas. Dessa vez o amor se apresentou na forma de um livro e não poderia ter sido mais surpreendentemente delicioso.

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“Minha pequena teoria é que, no âmago de toda ansiedade humana, está o medo da solidão. Começa com a saída do homem do útero e termina com uma cova no chão. E o espaço de tempo entre os dois é apenas uma luta desesperada para evitar a ansiedade da separação usando qualquer tipo de recompensa - amor, sexo, compras, bebidas, essas coisas. Minha composição trata do alívio passageiro e transformador da solidão que o amor oferece, apesar do frio certeza de que isso é apenas transitório.” Página 312


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