Um último adeus a uma rede social que marcou minha vida
Já fazia pouco
mais de um ano que eu tinha abandonado de vez o Orkut. Não sentia tanta falta
assim mais. Quase não ligava. Quase.
Hoje
recebi a notÃcia de que o Google tiraria o Orkut do ar esse ano, seria o fim
definitivo da rede social mais conhecida por muitos dos usuários antigos da
internet brasileira. Tudo bem, o Orkut já não era mais o mesmo, já fazia uns
dois anos que praticamente ninguém entrava no seu perfil e quem ainda usava o
site tinha que escutar umas boas risadas daqueles que migraram há tempos. Sei disso tudo. Mas ainda fiquei surpreendentemente chateada quando vi que o Orkut iria acabar de
vez.
Eu
tinha acabado de criar o MSN, aquele antigo mesmo, quando meu primo me convidou
para entrar no Orkut. Naquela época, não era qualquer um que podia criar uma
conta e pronto. O Orkut ainda recebia seus usuários através de convites e só
quem recebia um convite de um usuário poderia criar um perfil no site e assim
convidar mais amigos. Quando criei a minha conta, não fazia ideia de como iria
usar aquilo ali, era tudo muito novo pra mim. Eu era bem nova então tive tempo
de sobra para começar a fuçar tudo daquele site. A partir daÃ, tudo só evoluiu.
As
comunidades foram o que me fizeram ficar de vez no Orkut. Eu passava horas
procurando comunidades com tÃtulos engraçados e ficava louca para participar
como se aquilo acrescentasse muito à minha vida. Fui adicionando os amigos que
conseguiam entrar no site e ficava desorientada com o limite de 25 fotos. Com o
tempo, o site começou a ficar pequeno demais para mim. Mas isso não durou muito.
O
Orkut começou a crescer e cada vez mais pessoas ficavam loucas para entrar
naquela comunidade, até que o acesso por convite acabou. Foi um estouro. O
número de pessoas que começaram a entrar no Orkut era absurdo e empolgante para
quem crescia com o avanço dessa rede social. Se contentar apenas com o seu
perfil pessoal no Orkut já não era mais o suficiente. Nasceu a era dos fakes.
Naquela
época, os Ãdolos pop estavam em todo lugar, inclusive no Orkut. Algumas pessoas
começaram a criar perfis dedicados aos seus Ãdolos e isso não parou mais. Só
que não bastava mais criar um perfil dedicado ao Ãdolo, você queria assumir
outra identidade. Agora para fazer amigos, você não precisava se importar em
tirar uma foto bonita para colocar de perfil, seus Ãdolos faziam isso por você.
Lembro que criava vários perfis com personalidades diferentes, era como se em
cada perfil eu pudesse me identificar com alguma coisa. As comunidades cresciam
cada vez mais e ficaram mais divertidas. Era impossÃvel passar pouco tempo
nelas. Elas começaram a representar grupos especÃficos e ao mesmo tempo variados, qualquer um
podia se identificar com algum grupo, com alguma comunidade.
Uma
coisa que sempre me impressionou foi a quantidade de pessoas que abraçaram essa
rede social. Eu participava de várias comunidades e em cada uma delas havia um
grupo gigantesco de pessoas. Era inacreditável. Naquela época, com essa coisa
de redes sociais ainda surgindo, ficava surpresa com a facilidade de conversar com alguém que morava tão longe de mim. Conheci pelo menos uma pessoa
de cada estado e às vezes algumas pessoas nem no Brasil moravam. Para mim, o
Orkut marcou o começo da minha vida na internet, porque comecei ali e nunca
mais me desconectei.
A
“era fake” durou anos. Muita gente não conhecia esse mundo à parte do Orkut,
mas quem conheceu sabe do que estou falando. Aquilo era simplesmente
fantástico. Conheci tanta gente legal que acrescentou tanto à minha vida...
Como toda dona de um perfil fake que se preze, tive meus casinhos no Orkut e
vivi histórias incrÃveis, algumas até evoluÃram para a “vida real”.
Coincidências maravilhosas e casos engraçadÃssimos nunca faltaram pra mim
enquanto acessava meu perfil. Tive minhas decepções também, claro. Mas faz
parte.
O Orkut me marcou tanto porque foi o site que
começou a me direcionar. Deixa eu explicar... Na época dos fakes, existiam as
chamadas doações de fotos e os perfis mais populares eram aqueles que editavam
as fotos e disponibilizavam as edições nos seus álbuns – o limite de fotos
havia acabado, graças a Odin. Comecei a usar o PhotoFiltre Studio e o Photoshop
nessa época; descobri que aprendia rápido os tutoriais e os perfis começaram a
fazer sucesso. Meu gosto por fotografia começou ali já que comecei a tirar
algumas fotos para postar e vi que minhas edições não era as piores. Além
disso, foi participando das comunidades que percebi que era boa nos debates,
que eu sabia argumentar. Os assuntos sobravam nas comunidades e gente para
debater não faltava. Além de oferecer discussões, as comunidades também
serviram de jornal para mim que naquela época não gostava de ler notÃcias do
jeito convencional.
Mas
acho que a maior contribuição que o Orkut me deu, foi o hábito de escrever. Foi
no Orkut que descobri que eu sabia escrever e que eu amava aquilo. Comecei
lendo fanfics, web novelas. Me apaixonei logo de cara. Passava horas do meu dia
lendo histórias inventadas por meninas da minha idade. Era tudo muito democrático;
você não precisava ter o perfil mais pop ou ser conhecida em uma comunidade,
você escrevia um capÃtulo de uma história, criava um tópico, postava ali e
pronto, esperava. Li algumas histórias e antes que eu me desse conta, estava
escrevendo as minhas. Postava como quem não quer nada e com o tempo percebi que
as pessoas gostavam das minhas narrativas e algumas até pediam mais. Criei
minha própria comunidade onda postava minhas fanfics e vi meu trabalho
crescendo devagar, aos poucos. Quando me dei conta, não escrevia mais fanfics,
escrevia histórias com personagens criados inteiramente por mim, sem inspirações externas. Nunca mais
parei.
Gostava
de participar também de comunidades de leitores. Muitos dos meus amigos amavam
ler como eu então nunca faltava indicações. Acho que foi ali que comecei a
escrever minhas primeiras resenhas, apenas para mandar para um ou outro amigo. Enquanto
na escola muitos achavam ridÃculo ler tanto e tentavam me desmotivar, no Orkut eu tinha um incentivo sem igual. Conheci pessoas que gostavam de ler e por causa
delas continuei. Sou extremamente orgulhosa por nunca ter parado e os mesmos
que zombavam de mim por ler, hoje me pedem ajuda para escrever redações e
interpretar textos. Ler não leva a lugar nenhum, né?
Hoje
posso dizer que sou viciada em redes sociais. Mesmo não gostando muito do
Facebook, tenho minha conta, estou no Tumblr, Twitter, Instagram, Pinterest,
Skoob, We Heart It, Blogger, etc. E foi por causa do Orkut que conheci essas
redes sociais, direta ou indiretamente. O Tumblr, que com o Twitter é
minha rede social favorita, apareceu pra mim em uma comunidade no Orkut e com
alguns amigos. Minha escrita evoluiu ainda mais porque naquela época o Tumblr
era o lugar dos escritores, dos textos dramáticos e expressivos. O Twitter se
tornou um complemento do Orkut. Até conta no Formspring eu já tive porque todo mundo no Orkut tinha.
A
última – e talvez a mais especial – etapa foi a das irmandades. Entrar para uma
irmandade era algo exclusivo e muito animador. Existiam irmandades para uma
saga, uma série, um ator, uma atriz, tudo. Mas para entrar em uma irmandade,
você precisava passar por toda uma seleção para se mostrar digno, só um fã de
verdade conseguia. As seleções das grandes irmandades duravam quase um mês e
dezenas de pessoas participavam, era uma questão de status e fanatismo. A
seleção que eu participei era para uma irmandade dedicada à atriz Nina Dobrev e a
seleção apareceu para mim por acaso. Eu conhecia duas ou três meninas que
participavam da irmandade e não deixei a chance escapar. Passei na minha
primeira tentativa e foi uma das melhores coisas que aconteceram para mim em
todos os anos em que eu usei o Orkut. Conheci garotas maravilhosas que se
tornaram essenciais na minha vida a partir de então. As séries que comecei a
assistir eram indicações das sisters, alguns livros também. A gente passava
madrugadas conversando e rindo sobre as coisas mais inúteis. Cada uma morava em
uma parte do paÃs, cada uma tinha um jeito diferente, uma personalidade
diferente, e nada disso impediu que um vÃnculo incrÃvel se formasse. Isso é o
que eu mais sinto falta. O Orkut me apresentou pessoas maravilhosas que levo
até hoje comigo. Algumas coisas nunca mudam, assim eu espero.
Foi
conversando com uma das minhas amigas de Orkut que criei coragem para viajar “sozinha”
pela primeira vez e essa foi uma das melhores decisões que já tomei em toda a
minha vida. Criei coragem de viajar para os Estados Unidos com um grupo que não
havia trocado mais do que algumas palavras e foi uma experiência fantástica.
Passei
anos frequentando assiduamente o Orkut e não me arrependo de absolutamente
nada. Vi o Orkut mudando de todas as formas possÃveis e continuei mesmo quando
uma enorme parcela migrou para o Facebook e para outras redes sociais. Eu,
assim como a outra minoria, fiquei no Orkut até quando foi possÃvel. E foi
ótimo enquanto durou.
Com
o tempo, a graça já não era mais a mesma. As outras redes sociais me
satisfizeram mais. Eu amadureci e procurei outros lugares para compartilhar
meus novos gostos e talentos. Sempre que batia uma nostalgia básica, voltava ao
Orkut e passava pelas comunidades e perfis de amigos. É triste saber que não
vou mais poder fazer isso depois de Setembro, aquele cantinho gigante não vai
mais existir nem pra mim nem pra ninguém.
Acho
que como tudo na vida, o Orkut tinha que acabar uma hora ou outra. Mas fico feliz em saber que estive presente em
cada momento, que cresci com essa rede social, que pude acompanhar tudo de
pertinho, de dentro. O Orkut significou para a minha geração, o que o Facebook
hoje significa para a geração que está começando a navegar na internet. É
nostálgico ter que visitar pela última vez coisas que fazem parte de você, que
te marcaram de maneira irrevogável. Mas fazer o que? Sou grata por tudo o que
aprendi nesse site, por todas as pessoas incrÃveis que eu conheci, por todas as
histórias que tenho para contar e por tudo o que eu tive oportunidade de viver.
Acredite ou não, o Orkut foi fundamental para a minha futura vida profissional
e definitivamente fundamental para a minha vida pessoal.
Sim,
foi só uma rede social. Mas foi a rede social responsável por moldar a minha
adolescência e grande parte da minha personalidade. Novas redes sociais vão
surgir e o Orkut vai acabar sendo esquecido por quase todo mundo. Quase.
E você? Viveu essa época maravilhosa do Orkut? Vai sentir falta?